Apresentei em julho no Ciclo “Conversando sobre cinema na Zona Norte” o filme Catfish. Esse texto é fruto do que havia preparado como fala e do que foi debatido com o grupo que participou da sessão.
Catfish é um documentário americano de 2010 que conta a história de Nev, um fotógrafo de Nova York de 24 anos que acaba conhecendo a artista Megan pelo Facebook e iniciando um romance online. Ao ouvirem revelações surpreendentes sobre a moça, Nev e seus amigos embarcam em uma viagem em busca da verdade.
É difícil escrever sobre esse filme sem estragar a grande surpresa: Nev estava apaixonado por uma pessoa que não existia. Explico.
Todo o contato de Nev com a pessoa que ele desenvolveu afeto era feito por torpedos de celular, ligações telefônicas, emails e mensagens de facebook – principais meios de comunicação virtual da época. E, Angela, a pessoa que realmente existia, usou de todas essas ferramentas para criar personagens, não somente um, mas mais de uma dezena, a fim de poder sustentar uma história verossímil para Nev, que quando percebeu que estava em meio a uma relação com alguém que além de não ser alguém real, transformou isso junto com seu irmão e seu colega no tema do documentário: quem era essa pessoa que estava se passando por Megan?
Uma questão importante de ser levantada: como é possível nos apaixonarmos por alguém que não existe?
A princípio, podemos encontrar a resposta no meio virtual. Ora, ele permite que criemos perfis em questão de minutos, que possamos esconder nosso rosto, forjar vozes e sustentar histórias muitas vezes impraticáveis se estivéssemos frente a pessoa.
Mas proponho que mergulhemos mais a fundo nesse ponto. Afinal, não seria sempre que nos apaixonamos por alguém que não é aquilo pensamos?
Uma hipótese que podemos trabalhar é que Catfish apenas escancara algo que acontece em todas as relações, sejam elas virtuais ou não. Catfish leva ao extremo o fato de não nos apaixonarmos pelo que a pessoa realmente é, mas pelo que imaginamos dela.
Freud já escreveu isso lá em 1921: “Do estado de estar amando à hipnose vai apenas um curto passo. […] Existe a mesma sujeição humilde, que há para com o objeto amado. Há o mesmo debilitamento da iniciativa própria do sujeito;”.
Estar amando é análogo ao estar hipnotizado, deixamos de lado as realidades objetivas e as iniciativas que teríamos com outras pessoas – somos um pouco servos da pessoa amada. No nosso cotidiano, apesar de hipnotizados, existem pontos de congruências entre o que fantasiamos e o que é um fato objetivo. Em Catfish, nada era congruente, não havia intersecção com a realidade. Tudo que Nev viveu era uma invenção.
Não nos privemos de amar, mas saber as regras do jogo nos permite ao menos amar de uma maneira mais saudável.